27 de outubro de 2016

cadê?

Nos tempos de faculdade (cursei moda na FASM) frequentei muitos desfiles de moda atrás de inspirações. Com o tempo, e já estilista, passei a frequentá-los profissionalmente, participando dos backstages e conhecendo todos os  passos dessas produções que aos poucos se tornaram verdadeiros espetáculos.
Perdi a conta de quantos já fui.
Desde o extinto concurso Smirnoff Awards, que revelava novos talentos, ao precursor Morumbi Fashion, depois transformado em SPFW. Enfim, desfiles não faltam em meu currículo.
Vi a Gisele, vesti a Gisele, assim como todas suas colegas “angels” da Victoria Secret. Conheci stylists (profissão nova na época), figurinistas, dj’s, acessoras de imprensa e todo o circo armado para essas megaproduções.
Presenciei a palhaçada que rola para garantir um lugar na primeira fila , que deveria ser para formadores de opinião, mas que aos poucos foram substituídos por celebridades and wanna be’s.
A partir desse momento percebi que a grande maioria das pessoas que frequentavam esses desfiles frequentavam para verem e serem vistos. Mas para verem o que? As celebridades e uber models, oras! Pelo menos era isso que eu via. Conto nos dedos os desfiles que fui onde o que reinaram foram as criações dos estilistas, que deveriam ser a estrela principal. Nem menciono os estilistas, que na maioria das vezes eram escondidos no backstage sendo substituídos pelos donos das grandes marcas, que fingiam ser os verdadeiros criadores por mera questões egocêntricas.
Quanto as coleções que me chamaram a atenção por sua beleza e criatividade, conto nos dedos as que vi , e não me esqueci.
Walter Rodrigues foi um desses. Tive a sorte de trabalhar com ele e pude ver de perto a essência de um estilista de verdade. Em seus desfiless, me encantava e me inspirava com suas inspirações nipônicas e bom gosto na medida certa. Modelagem, corte e cartela de cores impecáveis. Clô Orozco da extinta Huis Clôs era outra que me inspirava com suas formas e estilo minimalista.
Sim, sei que tudo já foi inventado (e já saí da faculdade sabendo disso), mas também sei que hoje dependemos das releituras do que já foi criado. Releituras, seriam peças nas quais os designers se inspiraram para então as recriarem sobre um outro olhar. Neste olhar estaria embutido o seu estilo próprio, dando uma cara nova á peça  deixando-a com a cara do estilista.
Quando percebi que nada mais me interessava nessas passarelas, abandonei-as.
Não que eu tenha deixado de gostar do assunto pois ainda sou apaixonada por moda e criação. Simplesmente percebi que no Brasil os valores estavam completamente invertidos. Deixei de acompanhar esses desfiles de egos para encontrar inspirações em outros lugares.
Muito raro um bom estilista ser um bom administrador. Simplesmente pelo fato de arte e dinheiro não se misturarem.Por isso,os bons se foram.
Ora desistiram por falta de e$tímulo, ora faliram mesmo. Alguns venderam suas marcas, perderam seus nomes e passaram a criar copos de requeijão e band-aid (vide Herchcovitch/Isabela Capetto) e mini coleções para grandes magazines. Marcas foram vendidas e queimadas. 
E não pense que é só no Brasil não. Há anos não vejo um estilista com estilo despontar.E não é que eu esteja alienada.Acabo de voltar de uma mini-temporada em NY, onde não vi absolutamente nenhuma novidade.
Cadê o novo Issey Miyake com uns plissados repaginados? A nova Rei Kawakubo inovando nas formas e desconstruindo tudo o que já foi construído? Um novo Galliano transformando Versailles em seu reino novamente? Mas que este não seja tão idiota quanto o nosso, acabando sua carreira com comentários racistas de péssimo gosto.
Issey Miyake-pleats please!


Rei Kawakubo para Comme des Garçons


John Galliano em seu tempos áureos na maison Dior

Enfim, escrevo este post como um desabafo mesmo. Uma forma de eu tentar encontrar uma resposta para o que tanto procuro. Onde estão os verdadeiros talentos? Quero ver meus olhos brilharem perante uma novidade.
Existir sei que existem. O que falta mesmo são oportunidades, essas cada vez mais raras em tempos de fast-fashion engolindo o mercado vendendo roupitchas de péssima qualidade feitas por escravos em pleno século XXI.

Muito triste.